Um campo de golfe bem cuidado com uma baleia cor-de-rosa sorridente recebe os visitantes na sede da Vineyard Vines em Stamford, nos EUA. Na recepção desta marca de vestuário elegante, um carro de golfe com capota de lona estacionado ao lado de um balcão de recepção decorado com canas de pesca em alto-mar dá um ar de barco de pesca.
O escritório da empresa, com mais de 8 mil metros quadrados, está equipado com mobiliário de exterior em madeira, salas de reunião com um bar de estilo tropical, um pátio com vista para o porto e uma doca para barcos à vela. Sentado ao lado de Ian Murray está o seu irmão e co-fundador da empresa, Shep Murray, que diz que o seu objectivo “é ser uma mistura de Warren Buffett com Jimmy Buffett”.
Nos últimos 20 anos, Shep e Ian Murray, de 47 e 43 anos de idade, respectivamente, criaram um negócio que certamente impressionaria o Oráculo de Omaha.
Apesar das guerras de preços entre marcas de vestuário, da ascensão da moda rápida, do declínio dos grandes armazéns e da explosão do comércio online, a Vineyard Vines está a singrar.
Fundada em 1998, a marca conta hoje com 95 lojas e, em 2016, as vendas das camisas e gravatas com o logotipo da baleia superaram os 450 milhões de euros. É impressionante a escala que os Murray conseguiram ganhar e sem terem de abdicar da totalidade do capital da empresa.
“Não estamos no negócio da roupa. Estamos no negócio das marcas”, sublinha Ian.
Os dois irmãos desenvolveram a marca ao mesmo tempo que se assumiam como figuras descontraídas no mundo da moda. Com mais de 2800 empregados, a Vineyard Vines produz um vestuário clássico, mas descontraído, elegante e simples. Como estratégia, evita tendências extremas, não contrata celebridades como modelos e não participa em semanas de moda.
Num dos seus anúncios um avião aterra em águas azul-turquesa e por baixo pode ler-se a frase “Não desfilamos”. A razão deste slogan está na terrível batalha que todos os dias travam no mercado contra os gigantes do sector. “Nunca conseguiríamos vencer a Polo no polo,” explica Ian. “Não podíamos ser mais ostensivos do que a Bergdorf Goodman, e não podíamos ser mais duros do que a Patagonia. Mas podíamos ser nós— e gostamos de frequentar bares de praia e de diversão”, afirma.
O mesmo acontece com os clientes. “Eles conquistaram toda uma geração de consumidores quando a Ralph Lauren e a Tommy Hilfiger perderam fôlego,” afirma Marshal Cohen, analista de retalho do NPD Group.
“Trata-se de uma marca de retalho como a Apple — quem compra as suas roupas adere também ao resto da sua carteira de produtos”, diz.
O espírito pode ser descontraído, mas Shep e Ian gostam de controlar tudo. Mesmo no mais pequeno artigo, gerem de forma tenaz as várias dimensões da marca. “Comprar os nossos produtos é vestir a camisola da comunidade Vineyard Vines”, afirma Ian. “Não estamos no negócio da roupa. Estamos no negócio das marcas”, sublinha.
Donos do próprio destino
A empresa evita as cadeias normais e lojas online e vende através do seu site, em locais específicos como estâncias de férias, lojas profissionais e livrarias universitárias, bem como no seu império em ascensão de lojas próprias.
A sede tem um showroom onde os Murray atentam cuidadosamente a cada detalhe: a roupa nas prateleiras, a decoração nas paredes e até a música que sai dos altifalantes – os irmãos criam playlists específicas para cada loja.
E numa altura em que muitos retalhistas estão a fechar lojas para se centrarem no comércio electrónico, a Vineyard Vines está a centrar-se cada vez mais nas lojas físicas. “Se não tivermos uma loja na sua rua não se vai lembrar de nós”, exclama Shep. “Quando abrimos uma loja num determinado local as nossas vendas online aumentam fortemente”.
O desejo de evitar interferências externas foi um dos motivos que os levou a lançarem a empresa. Na verdade, abandonaram os empregos que tinham em empresas — Shep numa empresa de marketing e Ian numa empresa de relações públicas — para fazerem gravatas, por não quererem ter de usar gravata.
Há 20 anos, quando o estilo de vestir descontraído de Silicon Valley se espalhava pelo leste dos EUA, o timing não era o melhor para lançar um negócio de gravatas.
No início mantiveram os trabalhos que tinham durante o dia enquanto planeavam o negócio e até convenceram o dentista a retirar-lhes os dentes do siso, ainda saudáveis, enquanto tinham seguro de saúde.
Depois, os dois irmãos abandonaram os seus empregos e recorreram a um cartão de crédito para obter um financiamento de cerca de 6 mil euros.
O primeiro Verão da Vineyards Vines, em 1998, foi passado pelos dois irmãos a vender gravatas em parques de estacionamento, nas praias e nos bares da região. Mais tarde, imprimiram catálogos na Kinkos, colocando as gravatas directamente nas fotocopiadoras. Uma vez que não tinham dinheiro para contratar modelos, fotografaram amigos – uma tradição que continua ainda hoje.
Há 20 anos, quando o estilo de vestir descontraído de Silicon Valley se espalhava pelo leste dos EUA, o timing não era o melhor para lançar um negócio de gravatas.
Porém, os Murray apostaram numa tese diferente: sim, os homens estavam a usar gravatas com menor frequência, mas quando o faziam queriam destacar-se. E este sector dos acessórios tinha margens elevadas e não tinha problemas de dimensão.
Crescer com as dificuldades
Os irmãos aproveitaram uma oportunidade de negócio em 2002 quando a seguradora Aflac encomendou modelos customizados com a mascote da empresa, um pato. Os Murray enviaram um modelo e receberam uma encomenda de 10 mil gravatas no valor de cerca de 380 mil euros.
Quando o cheque com um adiantamento de 90 mil euros chegou, apressaram-se a comprar um barco e a cumprir o pedido, subornando amigos com pizzas e cerveja para empacotarem a mercadoria. As gravatas eram, e continuam a ser, feitas por fabricante nacional em Queens, Nova Iorque — tornando deste modo mais fácil cumprir as encomendas e fazer o controlo de qualidade.
Em 2004, a empresa decide alargar a actividade além das gravatas, e um ano depois, abre a primeira loja própria na ilha de Martha’s Vineyard. A esta seguiram-se outras lojas. Porém, quando tudo estava a correr bem, eis que rebenta a crise do subprime. “Durante alguns anos foi uma festa”, diz Ian, assumindo que a recessão obrigou-os a crescer.
“O que está actualmente a acontecer no retalho não é uma evolução,” afirma Shep. “É uma revolução.”
As vendas caíram 35%, alguns clientes cancelaram as encomendas e outros não conseguiam pagar. Com a empresa a viver dos pagamentos que ia recebendo, a sobrevivência exigia uma maior eficiência. Investiram em sistemas de gestão de stocks e de dados, renegociaram contratos de fornecimento, construíram centros de distribuição e remodelaram as suas principais lojas de rua a baixo custo. “A recessão encorajou-nos a investir nas nossas próprias lojas,” diz Ian.
O investimento preparou a Vineyard Vines para a recuperação económica. Os Murray vêem a actual revolução no retalho como uma oportunidade semelhante. Além da sua abordagem contra a corrente no que toca às lojas físicas, os Murray estão a tentar coisas novas online.
No ano passado interromperam a maioria dos descontos e promoções para melhorarem as suas margens e manter a exclusividade da marca. Esta medida atrasou o crescimento das vendas — que se espera subirem 5% e situarem-se acima dos 500 milhões de euros de 2017— mas sem accionistas ou investidores os Murray estão à vontade para fazerem experiências.
E estão mesmo a considerar uma expansão internacional e até extensões da marca para áreas como o mobiliário inspirado em estâncias de férias, restaurantes ao estilo de estabelecimentos de praia e pesca desportiva. “O que está actualmente a acontecer no retalho não é uma evolução,” afirma Shep. “É uma revolução.”