Ainda há investidores que valorizam a indústria pura e dura, feita de cheiros, cores e sensações. Valorizam a tradição e o luxo, sinónimos de negócio. Com a entrada de um grupo de investidores portugueses, a empresa centenária Ach Brito tem hoje o espírito de uma start-up.
Francisco Neto foi contratado pela Menlo Capital para liderar a empresa de Vila do Conde e confessa com entusiasmo que as expectativas são elevadas. Os novos investidores querem que a Claus Porto, a marca de topo da Ach Brito, passe de vendas de perto de 1,5 milhões de euros para 10 milhões de euros no espaço de seis a sete anos.
Este ano, o volume de negócios esperado é de 7,5 milhões de euros, o que representará um crescimento superior a 30% face a 2016. Só a marca de luxo, a Claus Porto, deverá ser responsável por quase metade desse bolo. O foco do negócio e da estratégia de crescimento da empresa está na Claus Porto, mas a Ach Brito e a Confiança (fábrica de sabonetes de Braga comprada em 2008) também vão ter um caminho de exportação.
“Queremos resgatar a marca sem estragar nada. A grande responsabilidade é essa, não estragar”, explica o presidente da Ach Brito.
Francisco é um gestor experiente. Dedicou grande parte da sua vida profissional ao grupo Logoplaste, tendo vivido, por exemplo, em Inglaterra, no Brasil, no México, no Canadá e na República Checa. Depois, esteve três anos no grupo Vicaima e antes de chegar à Ach Brito estava dedicado à empresa da família, dona da centenária Padaria Cristal (1930), no Porto. E trabalhou com Rui Moreira, actual presidente da Câmara Municipal do Porto, no projecto de restauro e modernização do Mercado do Bolhão.
Por terras do Tio Sam
O relançamento da Claus Porto assenta em três eixos fundamentais: lojas próprias (que a marca nunca teve), department stores e vendas on-line. Em Setembro do ano passado abriu uma loja no Chiado, em Lisboa, antecipando-se ao Porto por mero acaso. A inauguração da loja-museu no Porto, um espaço com três pisos na Rua da Flores, está prevista para a Primavera.
Francisco sustenta que “a qualidade, o detalhe e o rigor sobrepor-se-ão sempre ao tempo, apesar da lógica de fundo de investimento”.
Isto para dizer que a marca de luxo da Ach Brito também terá lojas em Londres, Nova Iorque, Hong Kong, Singapura. E não esquece o on-line – loja da Claus Porto que chega ao mundo inteiro.
A par da abertura das duas lojas próprias – Lisboa e Porto representam um investimento de 350 mil euros -, a Claus Porto está a reforçar a presença em department stores: Harrods, Galerias Lafayette, Le Bon Marché. “Há pouco tempo entrámos na Bergdorf Goodman e estaremos em breve na Neiman Marcus e na Saks”, adianta. Mas a grande aposta está do outro lado do Atlântico.
A Claus Porto é conhecida no mercado norte-americano há 25 anos, ou seja, muito antes da ascensão meteórica provocada por Oprah Winfrey, em 2004, e que apanhou a empresa em Portugal completamente desprevenida face a uma “chuva” de encomendas. Mas além da famosa apresentadora norte-americana, a marca foi coleccionando fãs: Nicolas Cage, Johnny Depp, Nancy Reagan e Kate Moss, entre outros.
A importância dos EUA na estratégia de crescimento da marca é tanta que Francisco viaja todos os meses para lá. “Temos uma subsidiária em Nova Jérsia, uma equipa residente e um distribuidor novo para abastecer boutiques e lojas de decoração, temos um operador logístico, stock e servimos o on-line entre 24 a 48 horas. Todas as grandes contas (Bergdorf Goodman e Neiman Marcus, por exemplo) são geridas por nós directamente”, conta.
“Não é suficiente ter 130 anos, vontade, produto para vender e um preço competitivo. O caso tem de ser demonstrado”, frisa o líder da Ach Brito.
Durante um ano foi o que fez: demonstrar até conseguir entrar, por exemplo, na exclusivíssima Bergdorf Goodman. Antes da entrada da Menlo Capital no capital da empresa, os EUA já eram o principal mercado da Claus Porto. O objectivo é que este mercado tenha ainda um maior impacto nas contas da empresa, que actualmente já é responsável por um terço das vendas. A meta é que 60% da facturação seja realizada do outro lado do Atlântico. E Francisco deixa isso bem claro quando organiza a sua agenda diária:
“o meu dia começa com os EUA, sempre, continua com os EUA e passa pela comunicação, marketing e desenvolvimento de produto.”
Além do mercado norte-americano, onde a prioridade é qualificar a presença, a Ásia também é muito importante para a marca, que está em mais de meia centena de países e conta com distribuidores e parceiros de negócio na China, Coreia do Sul e Japão, mas também na Austrália, Nova Zelândia, Arábia Saudita, Omã, Inglaterra e França, por exemplo.
Desafios dentro de casa
A comemorar este ano 130 primaveras, quem diria que a Claus Porto ainda é desconhecida para muitos portugueses. “As lojas demonstram isso mesmo (a de Lisboa e a pop up store no Porto, enquanto não abre a loja-museu). Daí a nossa decisão de abrir primeiro lojas em Portugal, porque muitos portugueses ainda não conhecem a marca.
Eu próprio, na minha rede familiar e de amigos, constatei isso”, refere o presidente da Ach Brito. A estrutura accionista é liderada pelo fundo de capitais portugueses Menlo Capital, seguida pelo accionista Aquiles de Brito, bisneto do fundador, e a Haitong Capital, um fundo de capitais também portugueses a quem pertence a outra participação minoritária. “A parte interessante desta história é que não é o estado de necessidade que motiva a venda da empresa (por Aquiles de Brito). A empresa tinha, e tem, contas saudáveis. Foi um cruzamento de vontades. O que nós trazemos (Menlo Capital) é um plano mais ambicioso e meios para o executar”, explica Francisco.
O relançamento da marca de topo da casa centenária faz-se com todos os colaboradores da empresa, mas há uma equipa maravilha que é constituída por Lyn Harris, a perfumista inglesa, Ann-Margreet Honing, directora de Arte, Danielle Mota, direcção técnica, e Carla Casal, responsável de marketing.
Com o novo accionista maioritário, o número de colaboradores aumentou. Passou de 57 pessoas em 2015 para as actuais 92 (mais 60%) em nome do reforço de competências: na área de marketing, inovação e desenvolvimento de produto. Porque, “além dos canais e do reforço comercial, é absolutamente decisivo ter substância”, conclui Francisco.