Cabos devorados por javalis, sensores que caíam dos postes e agricultores pouco satisfeitos. A primeira vida da Agroop nasceu torta. Bruno Fonseca e Bruno Rodrigues, os co-fundadores da empresa, começaram por criar uma multiplataforma que pretendia comunicar dados em tempo real: solicitar assistência remota, receber alertas climatéricos, quantificar os seus custos e até gerir recursos humanos.
Estávamos em 2014 e o pesadelo dos javalis não deixava o negócio seguir em frente. Ao mesmo tempo, se os agricultores não inserissem manualmente a informação, numa base diária, o produto não dava os resultados pretendidos e deixavam de ver a proposta de valor. Foi preciso esperar quatro anos para a ideia de negócio ganhar uma segunda vida.
No ano passado, os dois empreendedores lançaram o Stoock, um equipamento “chave na mão”, energeticamente auto-suficiente, sem cabos e simples de instalar. O principal objectivo desta nova solução é ajudar produtores agrícolas, consultores e empresas a gerir as necessidades hídricas das plantas e a prevenir pragas, doenças e fungos. Desta forma, o utilizador pode poupar recursos – água, energia e produtos fitossanitários – e obter uma produção de melhor qualidade. “Para que isto se possa fazer, os nossos clientes terão apenas de instalar nas suas explorações agrícolas um ou vários equipamentos Stoock que por sua vez irão recolher cinco parâmetros distintos e transmiti-los para uma aplicação chamada Agroop Cooperation”, explica Bruno Fonseca, presidente-executivo da empresa.
Na aplicação, os utilizadores poderão consultar todos os dados recolhidos como ainda uma série de outros dados centrais para uma tomada de decisão mais assertiva. Na prática, é um software que pode ser instalado no smartphone e onde o agricultor, após caracterizar a exploração agrícola, culturas e recursos disponíveis, entre outras informações, pode registar todas as operações culturais, identificando o que foi feito, por quem e durante quanto tempo.
Desta forma, é possível calcular a quantidade de água que uma planta perde por transpiração e perceber o nível que existe no solo. Ou seja, fazendo o balanço hídrico entre o que a planta perde e o que há na terra, sabe-se exactamente a água que os agricultores têm de repor para a plantar ficar no equilíbrio perfeito.
Os sensores recolhem informação de 20 em 20 minutos, comunicam via rede móvel e estão preparados para aguentar tempestades. Segundo o agricultor Nuno Correia, dono de 20 hectares de pêra rocha, “as poupanças são visíveis”.
Nuno destaca a capacidade de potenciar uma utilização mais eficaz da água, que se traduz numa poupança de energia (uma redução de 15%) nas bombas que puxam a mesma e ainda uma maior precisão e eficácia na utilização de tratamentos, “que se traduzem no bem-estar das nossas plantas e que resultou em média numa subida de produção de 10%”.
Batatas com textura e com tamanhos mais uniformes, pele com melhor aspecto e qualidade, poupança de água e de energia de 32% na produção e aumento da produção limpa (sem refugo) de 12,6% são alguns dos resultados da aplicação da Agroop num terreno da Cooperativa de Apoio e Serviços do Concelho da Lourinhã (Louricoop).
Esta solução, que tem vindo a ser desenvolvida e apurada desde 2014, registou um aumento de facturação próximo dos 400%, cifrando-se actualmente em 90 mil euros. Com nove colaboradores, de programadores até especialistas em marketing, têm como objectivo contratar business developers para criarem uma rede de parceiros pelos quatros cantos do mundo.
Ambição internacional
As culturas agrícolas onde o sistema Stoock é mais ajustado são sobretudo as de pêra rocha, abacate, maça, laranjas, abacaxis, produtos hortícolas e olivais. Em produtos como o milho, não há grandes vantagens.
“São explorações gigantescas e justifica-se mais uma monitorização por satélite”, sublinha Bruno Fonseca, adiantando que o modelo de negócio da empresa está assente em duas vertentes: na venda do equipamento (um sensor Stoock tem o preço de mil euros) e numa posterior subscrição do serviço (licença anual de aproximadamente 200 euros), pela utilização da plataforma e pelo acesso à inteligência e algoritmos gerados pela mesma.
Em Portugal, esta agrotech tem 70 aparelhos instalados de Norte a Sul do país. A nível mundial estão contabilizados 115, espalhados pela Europa, América, África e Austrália.
A Agroop foi uma das primeiras start-ups a obter investimento por crowdfunding na plataforma luso-britânica Seedrs, tendo lançado três campanhas e totalizado um financiamento total de 700 mil euros. Neste momento está activa a quarta campanha e a mais ambiciosa de todas. “É nosso objectivo alcançar os 500 mil euros de investimento para suportar o plano de expansão além-fronteiras”, conta Bruno Fonseca.
O financiamento servirá para a expansão internacional e contratar especialistas que consigam encontrar uma rede de parceiros e dar suporte ao cliente final. A criação de uma plataforma de big data é outro dos objectivos. Hoje em dia, o co-fundador da Agroop não tem dúvidas ao rever o passado. “Ou reinventava o negócio ou morria”.
Em 2018, esta start-up nacional instalou a nova tecnologia em sete países e neste momento já entraram também em Angola e nos EUA. O objectivo para 2019 é o de consolidar a presença no mercado americano, australiano e mercado ibérico.
“Depois de se ter validado a tecnologia, as propostas de valor, o modelo de negócio e a escalabilidade, vamos continuar a desenvolver casos de estudos que comprovem o retorno de investimento para os nossos clientes em culturas específicas. E vamos focar-nos em atacar mercados de maior dimensão – mercados que nos permitirão suportar grande parte do processo de expansão internacional”, afirma Bruno.
Para Robbie Walton, proprietário agrícola australiano, a criação portuguesa fez a diferença na produção de mirtilos. A irrigação e a fertilização das terras, especialmente em épocas de grande calor, foram feitas de forma mais eficiente. “O sensor Stoock tem sido vital para nós, assegurando que gerimos a nossa valiosa água em todos os momentos. A tecnologia auxilia-nos na tomada de decisões e em todos os aspectos do crescimento da produção, com dados reais”, explica à FORBES.
De acordo com estimativas das Nações Unidas, em 2050, a população mundial atingirá o valor recorde de 9 mil milhões e as necessidades alimentares irão aumentar entre 60% e 90%. É neste contexto que a Agroop pode ter um papel fundamental.
“Nas próximas décadas, os produtores agrícolas só conseguirão dar resposta a toda essa procura alimentar se munidos de ferramentas que lhes permitam de facto produzir de forma mais eficiente e sustentável.
É essa a grande ambição da empresa: contribuir para a mudança de paradigma e garantir que a maioria dos empresários agrícolas poderá fazer parte desta nova revolução tecnológica”, refere Bruno Fonseca.