Mariana Bleck é engenheira civil, mas hoje é quadro do Millennium bcp na área da banca de investimento. Na sua anterior encarnação profissional, adorava trabalhar no meio das obras. Trabalhou em construções emblemáticas como o Tróia Design Hotel, de cinco estrelas, no concelho de Setúbal, da responsabilidade da Edifer, como adjunta do director. Mas em 2011, com a crise e o abrandamento da construção no país, chegou a um impasse na carreira.
“Aproveitei a falta de obras que ia haver [em Portugal], porque eu não queria ir para Angola, e pensei que se calhar aquele era um bom timing para fazer um MBA [Master of Business Administration]”.
Um pensamento que tinha há algum tempo, mas sem data definida, conta à FORBES, sentada numa cadeira de um dos auditórios da Nova School of Business and Economics, faculdade que, juntamente com a Católica Lisbon School of Business and Economics, criou o The Lisbon MBA. Foi precisamente nesta formação de negócios que Mariana resolveu apostar para abrir novos caminhos na sua carreira.
“Tinha de ir procurar um novo trabalho, o que sabia que ia ser difícil, porque nenhuma das construtoras estava a contratar. Por isso, fui à procura de uma alternativa à construção. E pareceu-me bem, através do MBA, fazer essa alteração na carreira”, explica.
Diz que tropeçou no site do The Lisbon MBA por acaso, mas interessou-se na formação por ser em Lisboa, área onde reside, sem pôr em cima da mesa a hipótese de ir para o estrangeiro por motivos familiares. Acabou por fazer o programa full-time em 2011 e ingressou em 2012 no antigo BESI, hoje Haitong, para trabalhar na banca de investimento como gestora. Este tipo de pivot na carreira – no caso de Mariana, passar de engenharia civil para finanças – é uma das razões mais comuns para se frequentar um MBA, formação de gestão popularizada nos EUA que implica um período de tempo de estudo intensivo com vertentes analíticas e práticas. É uma formação cara, que em Portugal chega a alcançar os 30 mil euros por apenas um ano de formação, e nas melhores unversidades internacionais chega a alcançar os 100 mil.
Apesar de ser encarado como uma forma de dar um salto muito substancial na carreira, hoje a realidade mudou. A popularização dos MBA no mundo e, em específico, em Portugal – com a aparição de programas nacionais nos últimos 15 anos – e o abrandamento económico fez com que a rendibilidade dos MBA face ao seu custo total (que ultrapassa o valor das propinas, já que o programa a tempo inteiro exige total disponibilidade) diminuísse. Mas as motivações dos alunos não passam exclusivamente pelos aumentos salariais e ascensão em termos de cargos dentro das organizações.
Valor de mercado
Filipa Leite de Castro é especialista em executive search na consultora de recursos humanos Jason Associates. A sua actividade profissional é caçar cabeças para cargos directivos, isto é, faz recrutamento ao mais alto nível para empresas que necessitam de quadros superiores – e, pelos valores envolvidos, precisam de contratações certeiras.
E, a este nível de recrutamento, o MBA é uma formação desejável.
“Mas não é por se ter um MBA que as pessoas se tornam imediatamente directoras”, explica Filipa à FORBES.
“Ter um MBA não é um dealbreaker” na escolha de um headhunter num processo de recrutamento. Isto é, não é decisivo. Mas não era assim há alguns anos.
Antes do advento dos MBA nacionais tal como estão estruturados hoje, ter uma formação de negócios deste género no currículo era uma enorme mais-valia. Isto porque ter um MBA implicava naturalmente ter uma formação em escolas de elite a nível mundial como a INSEAD, de Fontainebleau, em França, e a escola de negócios da Universidade de Stanford, nos EUA. “Há 15 anos não havia praticamente MBA portugueses que fossem relevantes”, realça Filipa. Era mais raro ter um MBA, diz, e quando alguém o tinha, “era realmente alguma coisa extraordinária”, ou seja, com o selo dessas escolas de topo.
“Na altura, isso permitia uma subida na carreira das pessoas realmente diferenciadora. As pessoas vinham do MBA com a expectativa de terem feito um investimento que lhes permitisse saltar vários degraus na sua carreira”, diz a gestora da Jason Associates. O expectável em Portugal – porque grande parte de quem fazia esses MBA acabava por ser convidado para trabalhar fora – seria alcançarem rapidamente um cargo de direcção ou de administração. Hoje, com o passar dos anos, os MBA em Portugal ganharam uma sofisticação que antes não tinham. E, defende Filipa, hoje, apesar de “ainda se dar um crédito um pouco maior” às formações de negócios estrangeiras, “os MBA cá já são reconhecidos”. Isto tudo graças ao reformular dos programas, ao ingresso de professores e alunos estrangeiros e com a associação a universidades internacionais.
Mas, para os recrutadores, o MBA “banalizou-se” e, com isso, deverá haver uma reconfiguração das expectativas de quem quer o canudo. “Já não catapulta como catapultava há dez anos” nos degraus da escadaria corporativa, defende Filipa. Mariana diz que conhece pessoas que, saídas do MBA, “pediam rios de dinheiro [às empresas], até mesmo em casos de transição de carreira”, lamenta. O que tem um efeito perverso: “Muitas vezes chega-se às empresas e já não querem MBA porque são caros”, diz a ex-aluna. Outro factor de depreciação da vertente salarial foi o facto de Portugal ter passado pela crise, levando as empresas portuguesas a hesitar na contratação de quadros com esta formação. Mais caros.
Durante a crise, o desemprego fez com que as faculdades ganhassem renovado interesse. Jorge Gomes, líder do MBA do ISEG, diz que esses anos foram “óptimos para as universidades. Nós tivemos [o ISEG] cheio. As pessoas não tinham trabalho, mas tinham dinheiro. A mentalidade era: ‘vamos investir em educação’. Quando isto passar, o investimento terá sido bom.” E Filipa ressalva: “Nunca ouvi alguém dizer que estava arrependido de fazer um MBA, independentemente do investimento que fez”. As únicas queixas que ouviu de candidatos ao longo dos anos, diz, tiveram que ver com a enorme exigência de tempo – e emocional – que o MBA implica.
Objectivos de carreira
Fernando Santos é doutorado em Neurociência pela Universidade Nova de Lisboa e investigou na Fundação Champalimaud, depois de ter começado o seu percurso académico na Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto, onde tirou Ciências Farmacêuticas. Na Fundação, lançou, com mais três sócios, um projecto que hoje é uma start-up. Em 2015, com vontade de deixar de estar acantonado no laboratório, e espicaçado pelas exigências da nova empresa, percebeu que precisava de aprender mais na área da gestão para poder liderar projectos empresariais. É um empreendedor de espírito.
À data em que falou com a FORBES, Fernando estava a terminar o 3.º trimestre do The Magellan MBA, na Porto Business School. Revelou-nos não estar a pensar numa carreira corporate quando terminasse o MBA, mas sim em fundar a sua própria empresa na área do turismo. “O meu objectivo era ganhar competências para complementar o meu background científico”, diz. Por isso, escolheu entrar na Porto Business School tanto pela proximidade geográfica com a sua cidade, Braga, e pelo facto de o programa se adequar ao seu objectivo principal: obter as ferramentas necessárias para conseguir empreender. “Sabia que o objectivo do programa era pegar em pessoas que não têm experiência no mundo dos negócios e dar-lhes muito rapidamente estas competências para mudarem de carreira”, resume Fernando.
Tal como aqueles que procuram obter conhecimentos para conseguirem conduzir o seu próprio negócio, há muitas outras motivações. A principal de quem faz o MBA full-time, apontada pelas directoras do The Lisbon MBA e do The Magellan MBA, Anabela Possidónio e Renata Blanc, respectivamente, é a mudança radical de carreira, tal como Mariana e Fernando. Mas há mais, naturalmente.
Segundo um estudo do Graduate Management Admission Council (GMAC), 27% dos candidatos tem como objectivo o reconhecimento social e dos pares ao fazer o MBA, 14% visa iniciar uma carreira internacional, 13% quer revitalizar a carreira, 13% tem como objectivo reciclar conhecimentos, e 10% tem como motivação conseguir melhorias financeiras e de carreira, mas com foco na estabilidade e vida familiar. A ascensão social e económica, contudo, está implícita em todos eles. “Em cada uma das situações é preciso perceber o que se quer conseguir no pós-MBA. Não podemos ver o MBA como a única alternativa de formação pós-licenciatura”, diz Filipa, referindo-se a mestrados, pós-graduações e outros cursos não conferentes de grau que abrangem temas específicos, como finanças, empreendedorismo ou social skills. “O MBA conjuga uma série delas”, resume, “mas em muitos casos não faz sentido fazer esse investimento. É preciso tentar balizar um pouco aquilo que cada um pode tirar do MBA.”
Os programas de MBA têm vindo a reforçar a vertente de empreendedorismo, acompanhando o espírito do tempo. Tanto Anabela como Renata e Jorge dizem que, nos últimos anos, este tema foi reforçado nos programas precisamente para preparar futuros empresários com novas ideias. Mas esta não será uma formação de valores demasiado avultados simplesmente para aprender a ser empreendedor? “Foi algo com que me debati”, diz Fernando. “Há artigos que dizem ‘não gastes o teu dinheiro a fazer um MBA’ e outros que dizem que é uma ferramenta muito boa.” Fernando – que financiou parte das propinas do Magellan através de uma bolsa atribuída pela escola – relativiza e assume que “provavelmente não” terá grande racionalidade em termos financeiros investir num MBA só para fundar depois uma empresa. Mas sabe que o MBA vai dar-lhe mais do que conhecimento: vai transformá-lo e dar-lhe o passaporte para uma nova vida.