A inclusão da produção de ovos no Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) 2013-2017, com vista à redução ou eliminação da importação do produto, justificou o forte apoio prestado, até há pouco tempo, pelo governo angolano aos produtores – entre pequenas e médias empresas, no quadro do extinto programa Angola Investe.
Muitas foram as empresas que abraçaram a iniciativa e lançaram-se ao desafio. Os resultados não tardaram em aparecer: a produção de ovos aumentou significativamente, passando de 400 mil unidades por dia, em 2012, para mais de 1,7 milhões até 2017. O objectivo de tornar o país autossuficiente na produção de ovos foi alcançado. Há mais de cinco anos que Angola deixou de importar ovos.
O suporte do Executivo, aliado à criatividade, ao engenho e à vontade de querer fazer, por parte de quem tem vocação e aptidão para a avicultura, permitiu que hoje a maior parte dos ovos comercializados no território nacional esteja a ter origem de galinhas poedeiras criadas em sistemas locais de confinamento intensivo, modelo no qual as aves são alojadas em gaiolas dentro dos aviários, durante toda a sua vida produtiva.
Esse sistema de produção em massa viabilizou o aumento do consumo e transformou o ovo em uma das principais fontes de proteína animal acessível a um número considerável de cidadãos, até há pouco tempo.
Se até 2015 um ovo custava, em média, 25 kwanzas no mercado informal, hoje para se ter o produto à mesa são necessários, no mínimo, entre 100 kwanzas a 120 kwanzas por cada unidade, o que corresponde a um encarecimento na ordem dos 480%, segundo contas feitas pela FORBES.
Ao que parece, a cadeia de produção, sem garantias de insumos para a confecção de ração, bem como da aquisição e manutenção dos equipamentos que concorrem para a produção e distribuição ao mercado, nomeadamente as embalagens, a ração, a vacina para as aves, entre outros, esteve e continua assente em bases frágeis e a crise económica que o país atravessa há seis anos, agravada agora pela pandemia da Covid-19, veio destapar o véu.
A situação actual do sector é descrita por vozes autorizadas como crítica. “O actual momento da produção de ovos no país é caracterizado por uma redução acentuada, como resultado da paralisação particularmente de grande parte de pequenas e médias empresas, nós últimos quatro anos, principalmente por dificuldades na aquisição de ração e de outros insumos”, avança à FORBES, Rui Santos, presidente da Associação Nacional dos Avicultores (ANAVI).
De acordo com o líder associativo, o censo avícola, realizado há cerca de três anos, mostrou que entre os 120 produtores existentes na altura, 50% já haviam paralisado e que 20% estavam em vias de paralisação por vários motivos. “Houve, num passado recente, um crescimento em termos de infra-estruturas e efectivos, que nos levou à produção considerável. Entretanto, não fomos correspondidos pela produção de milho e soja, matérias-primas fundamentais para a produção de ração, e isso criou um défice do produto, originando dificuldades de acesso à ração em quantidade e qualidade desejadas”, precisou.
O défice na produção de insumos bem que tentou ser coberto com recurso à importação, mas esbarrou-se nas operações bancárias que eram muito demoradas, motivadas pela escassez de divisas. “Tudo isso foi desmotivante”, conta.
“O sector vive o seu pior momento”
Sobre a actual fase da produção avícola do país, Maria José Galante, administradora da empresa Copinol, proprietária da fazenda Avinova, uma das que se destaca na produção de ovos na capital do país, vai mais longe e considera mesmo estar-se a viver o pior momento do sector, desde 2012.
Conforme revela, 92% dos pequenos e médios produtores paralisaram a actividade. “Desafio o Governo a apostar nesse sector, que tem capacidade de gerar mais de 1.000 postos de trabalhos directos e acima dos 4.000 indirectos”, remata a também vice-presidente da ANAVI.
A fazenda Avinova, diz, está actualmente a funcionar apenas a 20% da sua capacidade instalada para a produção de ovos, não estando a produzir frangos de corte desde 2008, por falta dos principais insumos para a formulação da ração, em quantidades e a preços competitivos. A produção na fazenda que rondava os 2 milhões de ovos por mês, até 2017, baixou hoje para cerca de 350 mil, com reflexos também negativos na facturação, que caiu de 130,6 milhões de kwanzas por mês, em 2016, para 35 milhões de kwanzas mensais actualmente.
Dados da ANAVI dão conta que de uma produção nacional que rondava os 75 milhões de ovos por mês, entre 2015 e 2016, período em que se atingiu os níveis mais elevados de sempre, hoje não se passa dos 55 milhões de unidades.
Luanda, com um efectivo em produção de cerca de 800 mil galinha poedeiras, Bengo (750 mil), Cuanza Sul (230 mil) e Benguela (50 mil) são, segundo Rui Santos, as zonas de maior produção de ovos.
Maria Galante não vira a cara à luta. Desistir está fora da equação. Enquanto aguarda por um financiamento de 450 milhões de kwanzas para a reconstrução da cadeia produtiva avícola da fazenda, facilitado pelo Programa de Apoio ao Crédito (PAC), está a unir sinergias, juntamente com a ANAVI e os produtores de milho e soja, para repovoamento nacional de aviários de pequenos e médios produtores, onde a Avinova espera receber 100 mil pintos.
Caso o financiamento seja disponibilizado, a previsão é que 315 milhões de kwanzas sejam investidos na produção de ração e os restantes 135 milhões de kwanzas em infra-estruturas da fazenda. “Estamos na esperança de que a situação melhore, que a banca e o Governo conheçam e compreendam melhor a nossa actividade, que se criem políticas para que o sector possa de facto caminhar e que consigamos montar a cadeia produtiva”, afirma a gestora.
A FORBES procurou ouvir outros produtores avícolas sobre o momento actual do sector – entre eles a fazenda Pérola do Kikuxi, detentora da marca Kikovo e considerada a maior produtora de ovos do país – mas não foi bem-sucedida.
Maiores produtores de ovo do país
Instituição | Capacidade produtiva (em unidades) |
Fazenda Pérola do Kikuxi | 1.300.000 |
Fazenda Filomena | 1.000.000 |
Aldeia Nova | 300.000 |
Uniovo | 100.000 |
Avinovo | 100.000 |
Avinova | 75.000 |
Pecac | 60.000 |
Caah | 50.000 |
Fazenda Aline | 50.000 |
Santa Filomena | 50.000 |
Fonte: ANAVI