Senti o coração apertado quando em Luanda os talentosos miúdos da Orquestra Sinfónica Camunga tocaram ‘Os Meninos do Huambo’ na voz de Rui Orlando e numa homenagem a Mingas e a todos os que fazem da responsabilidade social um ato Maior. Parecia um hino. Não o hino que compôs para o seu país. Esse tem honras de Estado, o Angola Avante, que reclama, nas suas palavras, “um só povo, uma só nação” epíteto que tem inspirado artistas e políticos nos seus discursos mais inflamados.
É esse fogo que Rui Mingas tinha nas palavras.
Poderia ter sido só um atleta e já teria sido grande. Praticou nas décadas de 1950 e 1960 e conquistou o recorde nacional no salto em altura em Portugal.
Poderia ter sido só um compositor. E já teria sido brilhante. Foi membro fundador do grupo Ngola Ritmos, lançou o seu primeiro álbum intitulado Angola em 1970 e musicalizou poemas de nacionalistas como Viriato da Cruz, Agostinho Neto e António Jacinto. Eterno, eterno é o seu próprio portfolio com “Poema da farra”, “Makezu”, “Birin birin”, “Monagambé”, “Adeus à hora da partida” e, claro, “Meninos do Huambo”. Cantava assim e assim nos conquistou no embalo deste refrão que fica, mais do que na nossa memória, no nosso coração
Os meninos à volta da fogueira
Vão aprender coisas de sonho e de verdade
Vão aprender como se ganha uma bandeira
Vão saber o que custou a liberdade.
E por falar em liberdade, poderia ter sido só um diplomata. Ou só um ativista. Mas conseguiu ser ambos em momentos certos da História, feito nada fácil, mas nele era quase tudo tão natural, onde quer que estivesse, a representar Angola “com talento, competência e dignidade”, palavras de João Lourenço.
Militante do MPLA desde a primeira hora, Rui Alberto Vieira Dias Rodrigues Mingas foi deputado à Assembleia Nacional, secretário de Estado da Educação Física e Desporto, embaixador de Angola em Portugal e reitor de uma universidade privada
Marcelo Rebelo de Sousa escreveu sobre ele: “Mingas parece ter estado em todos os lugares onde Angola se afirmou como jovem nação, em confronto com o regime português até 1974, mas não em choque com Portugal, pois também os portugueses reconheceram nele um símbolo da nossa relação com os angolanos, que abarca as vicissitudes passadas, as memórias e afetos em comum, um futuro de parceria e respeito mútuo”.
E por isso esta é uma homenagem prestada por todo uma lusofonia que ouviu e sentiu Rui Mingas. Poderia ter sido tudo, mas foi sobretudo um poeta. Porque o poeta quando fala, fala mais alto!