Quem vive em Luanda recordar-se-á do polémico caso do “melão de ouro” ocorrido em 2011. O melão importado chegou a custar 9 mil kwanzas, que na época equivalia à cerca de 100 dólares americanos.
Hoje, é possível comprar um melão delicioso e suculento made in Angola por cerca de 2 dólares (1.500 kwanzas). O que mudou em 10 anos? Certamente alguns visionários
do agronegócio decidiram enfrentar todas as dificuldades e obstáculos e apostaram no plantio de melão; faço-lhes humilde vénia, pois é de empreendedores obstinados que o país precisa!
Quando soube da recente medida emanada pelo Ministério do Comércio e Indústria, a proibir a utilização de divisas do tesouro nacional para a importação de alguns produtos da cesta básica produzidos em Angola, aplaudi a intenção de protecção à produção nacional.
Contudo, defendo que teria sido mais consensual o agravamento das taxas de importação desses produtos, evitando-se a imagem de um Estado interventivo no livre comércio e eventuais fricções com a Organização Mundial do Comércio.
Não obstante, é inegável que a produção nacional só é viável com medidas de apoio e a protecção do Executivo. É o que fazem todos os grandes players mundiais: adoptam fortes medidas proteccionistas e injectam milhares de dólares em financiamento bonificado aos seus sistemas de agronegócio.
Muitos, temendo o aumento dos preços, questionam se existirá capacidade interna para a demanda nacional dos produtos abrangidos pela medida, designadamente o massango, a massambala, o alho, a cenoura, a cebola, o feijão, a batata doce, o amendoim, o tomate e a água engarrafada.
Outros, alertam para a questão da falta de infra-estruturas e de meios logísticos. Eu diria que os obstáculos existem, mas já não é justificável, sendo até inconcebível que um país com 57 milhões de hectares de terras aráveis, água com fartura e taxas de desemprego alarmantes, continue a importar cebola, tomate ou alho.
Assim, esta medida do Executivo, pese embora controversa, poderá representar o início de um árduo e corajoso caminho que o país deve, necessariamente, percorrer para atingir a sua auto-suficiência alimentar, em linha com o Decreto Presidencial 23/19. Muitas acções do
Executivo serão impopulares para os lobbies da importação, pois, só entre 2018 e 2019, o país gastou cerca de sete mil milhões de dólares, com recurso às reservas internacionais, para a importação de bens alimentares, sendo que, desse valor, cerca de 40% serviu para a importação de produtos da cesta básica. Angola tem sido, portanto, um bom cliente para os países exportadores, em prejuízo do seu desenvolvimento interno.
É tempo de superar obstáculos e alavancar a produção nacional. Trata-se de uma questão de sobrevivência, de luta contra a fome e a desnutrição e, muito importante, de soberania. Por outro lado, o agronegócio tem a capacidade de gerar milhares de empregos directos e indirectos, sendo certo que existem muitos jovens à espera de um futuro, de um emprego no campo ou na indústria. Angola não pode esperar!
L E O N O R S I M Õ E S F E R R E I R A
Advogada, certificada em Direito do Agronegocio pelo INSPER