No passado dia 18 de Janeiro de 2022, foi publicado o Decreto Presidencial nº 13/22, através do qual se aprova o Roteiro para a Reforma do Sector Empresarial Público, iniciativa que se entende meritória face às conhecidas necessidades de reestruturação e redimensionamento do Sector Empresarial Público (SEP) em Angola.
Sendo inquestionável a importância desta iniciativa, em particular por representar um roteiro assente numa caracterização fundamentada e numa visão estruturada para a reforma do SEP nas suas a diversas dimensões, importa reconhecer os desafios e as oportunidades que lhe estão subjacentes, num processo que se afigura naturalmente complexo e num contexto em que parte relevante das empresas do SEP evidenciam deficiências a diversos níveis.
É nesta perspectiva que, a tomada de acção imediata por parte dos agentes mais directamente envolvidos no processo (eg Conselhos de Administração), se afigura como determinante para que estes possam ter um papel relevante na implementação da estratégia de reforma do SEP. Nestas circunstâncias, a realização de um diagnóstico detalhado, em cada uma das empresas abrangidas, sobre o estágio de maturidade das diferentes dimensões em análise, perspectiva-se como uma primeira acção prioritária para definição de um plano de acção alinhado com as directrizes do Roteiro para a Reforma do SEP.
Focando-me mais especificamente na dimensão da qualidade do relato financeiro, e não ignorando o facto de o caminho a percorrer ser longo e difícil, esta é sem dúvida uma oportunidade única para a adopção de melhores práticas com reflexo evidente:
- – na melhoria do desempenho económico e financeiro das empresas, e consequente minimização / eliminação dos impactos negativos para as finanças públicas, onde o Estado é recorrentemente chamado para prestar apoio, seja no contexto de processos de recapitalização ou concessão de garantias;
- – na mitigação dos riscos de fraude;
- – na preparação, nos casos aplicáveis, para dar reposta aos extensos e complexos requisito que estão subjacentes ao processo de privatização; e,
- – no atracção, desenvolvimento e retenção de talento.
Dando alguns exemplos concretos, os quais estarão alicerçados no pressuposto da implementação de procedimentos e controlos efectivos, as empresas do SEP terão de cumprir de forma efectiva com os requisitos de prestação de contas de forma regular (e.g. trimestralmente), aliado a elevados padrões de qualidade e fiabilidade da informação a reportar, o que significa desde logo que as demonstrações financeiras devem estar isentas de erros ou omissões materialmente relevantes, ou seja, deverão ser resolvidos os assuntos que têm conduzido a que os relatórios emitidos pelos Auditores Independentes evidenciem diversas reservas.
Efectivamente, há margem da definição de um plano de acção detalhado e estruturado para dar resposta aos desafios acima elencados, existem alguns instrumentos, de aplicação mais prática e imediata, que podem contribuir para a melhoria da qualidade do relato financeiro, destacando-se entre eles i) a execução de rotinas efectivas de fecho mensal de contas, apoiadas num conjunto de procedimentos que devem ser objecto de revisão e supervisão tempestiva e apropriada, ii) a concepção de programas de formação direccionados, que capacitem os quadros mais directamente envolvidos no relato financeiro, e iii) o desenho e implementação de dashboards de gestão que permitam o acompanhamento pelo Conselho de Administração dos principais indicadores de actividade da empresa e a respectiva identificação de desvios e/ou variações não usuais para análise detalhada e tomada de acção correctiva, nos termos aplicáveis.
O acima exposto centra-se na perspectiva dos desafios e oportunidades para a empresas abrangidas pelo Decreto Presidencial, sendo que importa não esquecer o papel fundamental que o Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (“IGAPE”) terá em todo este processo. Desta forma, também sobre o IGAPE recai, entre outras, a responsabilidade de supervisão e monitorização regular e efectiva deste processo com o objectivo de apresentar um reporte financeiro consolidado das entidades do SEP. A este propósito, entendemos relevante destacar aspectos como a sistematização e a operacionalização de modelos de reporte, cujo desenho e implementação por certo que envolverá dimensões relacionadas com a preparação dos sistemas de informação, a preparação de manuais de políticas contabilísticas, a implementação de técnicas de automação, a concepção de um plano de formação abrangente para os quadros da empresa, o robustecimento das estruturas internas para acompanhamento do grau de cumprimento das obrigações por parte das empresas do SEP, entre outros aspectos.
Termino reafirmando que esta é uma oportunidade única, que envolve naturalmente desafios e um esforço conjunto muito significativo, mas absolutamente necessária para o SEP ir ao encontro das legítimas expectativas e interesses dos diversos stakeholders, contribuindo para a criação de valor a longo prazo.