Com uma experiência na banca que já leva perto de 18 anos, Carolina Remisio entrou no sector pela porta do Barclays, um banco com sede no Reino Unido e que até 2016 teve operações de retalho, crédito e investimento em Portugal. A jovem, filha de pai angolano e mãe portuguesa, fez história, ao se tornar na primeira pessoa de Angola a ser promovida a um cargo executivo sénior regional do Standard Bank Group.
A luso-angolana, que nasceu em Portugal, mas que sempre viveu em Angola, foi nomeada, em Abril do ano passado, diretora-executiva de banca comercial para regiões de África e offshore do Standard Bank Group, um cargo que, diz, irá desempenhar da forma mais correcta posível, de maneira a conseguir fazer crescer, para a instituição que representa, a banca comercial. “É para isso que fui contratada. Portanto, é conseguir ter uma estratégia uniforme em África”, sublinha, em conversa com a FORBES ÁFRICA LUSÓFONA.
Entretanto, Carolina tem noção de que cada país tem a sua particularidade, e o grupo é muito específico em não querer ter uma regra para todos. “Todos os países têm de ter a sua estratégia, a sua disciplina, e depois essa diferença é que faz de nós o todo”, frisa.
Como responsável da banca comercial para regiões de África, tem sob a sua jurisdição 14 países, divididos em três regiões, além de 13 offshores. Na primeira região estão Zâmbia, Moçambique, Zimbabué, Namíbia, Essuatíni, Lesoto e Botsuana. Na segunda se encontram a Nigéria, o Gana e Angola, sendo que Quénia, Uganda, Tanzânia e Maláui integram a terceira região.
Remisio aponta o facto de ter um plano de sucessão “bem feito”, a sua ambição, perseverança, capacidade de desenvolver equipas e de gestão de pessoas, bem como a persistência que garante ter com números, como factores que terão pesado para a sua promoção ao actual cargo.
“Lembro-me de que, quando comecei a exercer funções na área da banca comercial, o meu director na altura disse-me, quando estávamos a apresentar Angola, que nem queria saber dos números do país, porque eram insignificantes no meu balanço. E eu levei aquilo muito a peito e disse que Angola não pode ser insignificante. De repente conseguimos fazer com que Angola fosse o segundo ou o terceiro país da região. No ano passado tivemos algumas dificuldades cambiais, mas sempre a conseguir elevar o nome de Angola, e isso foi o motivo pelo qual eu considero ter sido escolhida”, supõe.
“Ter de pedir às pessoas para irem abrir as agências, sacrificando-se porque era um serviço primário do banco, quando estávamos todos fechados em casa, foi uma das alturas mais desafiantes da minha carreira.”
Carolina Remisio faz parte do grupo de 15 pessoas que deram início, em 2010, ao processo de instalação do Standard Bank em Angola. O seu percurso dentro da instituição teve várias evoluções, mas nem sempre foram subidas de categoria ou de função. Fez também muitas mudanças colaterais que lhe permitiram conhecer o banco nas suas diferentes áreas. Começou como gestora de banca transaccional e depois passou para gestora de clientes do sector do consumo, um sector muito vasto no país, que lhe permitiu conhecer o mercado, as importações e medir a pulsação da economia.
“O sector do consumo mostra muito a realidade do que é uma economia. O sector de consumo é maioritariamente o mercado informal, portanto, eu conheço os mercados informais, sei como funcionam, e isso dá-me uma visão de como realmente vivem as pessoas, porque o mercado informal, que representa 80% da nossa população, é o que o país sente, porque os outros 20% quase que não contam para esta estatística”, defende, para mais adiante acrescentar que esta realidade fez nascer em si um sonho, que é fazer crescer África e Angola.
“Angola, efectivamente, é a minha casa, e se me perguntar se quero regressar a Portugal, se calhar, não, porque eu vim para cinco anos e já passaram 14. E esta função nova vai permitir-me exactamente conseguir fazer isso: fazer África crescer”, indica a jovem bancária formada em Economia pela Universidade Lusíada do Porto (Portugal).
Ser promovida a um cargo sénior regional é para Carolina motivo de orgulho e de muita responsabilidade. “Isso acarreta grande responsabilidade, porque cabe a mim levar a bandeira de Angola para todos os sítios aonde eu vou. Explicar exactamente em todos os sítios aonde eu vou que existe muito talento no país e que nós sabemos fazer as coisas da forma correcta”, considera a gestora bancária, que tem agora também a missão de espalhar a angolanidade por África afora.
Plano de sucessão perfeito
Para Carolina, a sua nomeação a tão prestigiante cargo vem provar que em Angola, onde a liderança feminina vem conquistando o seu espaço, existe muito talento. “Não podemos esperar ser promovidos se não temos ninguém que vá suceder o nosso trabalho. Sabiam que, se me tirassem de Angola, a área que eu dirigia funcionaria tranquilamente. Eu posso ser substituída amanhã, mas quero garantir que as pessoas que eu chamo para trabalharem comigo são melhores do que eu e que eu consiga fazer a equipa funcionar na minha ausência”, realça.
A jovem está determinada em continuar a trabalhar com os países da região sob sua tutela da mesma forma que fez em Angola, garantindo que haja sucessão, sectores preferenciais e assegurar que estarão todos a fazer África crescer, emprestar a pequenas e médias empresas, de forma a criar um continente sustentável, fazendo jus ao slogan do Standard Bank “Africa is our home; we drive her growth”, o mesmo que dizer em português: “África é a nossa casa; nós impulsionamos o seu crescimento.” Um crescimento que passa pela criação de empregos e sustentabilidade.
“Estamos agora em alguns países já a ver as energias renováveis. Não é só a preocupação de não poluir o ambiente, mas garantir que temos custos de produção mais baixos, que África consegue ser competitiva, que África consegue ter uma parte importante na economia mundial. Portanto, o crescimento está efectivamente todo em África, e eu tenho a oportunidade de fazer parte deste crescimento”, regozija-se.
A confiança da funcionária do Standard Bank Group numa economia africana forte assenta também no facto de, em países como Moçambique e Angola, que bem conhece, estarem a ser dadas às mulheres na banca as mesmas oportunidades que se dão aos homens. “Acho que, no geral, nestes dois países existe um grande esforço na liderança feminina. Têm dado passos largos no tema liderança feminina”, reconhece.
Entretanto, alerta que a liderança feminina só é possível quando existe um apoio muito forte da sociedade e, subretudo, no seio familiar, lembrando que, em relação aos homens, as mulheres têm funções e tarefas domésticas adicionais. “A liderança feminina acontece quando existe um suporte em casa, e eu gostava de deixar esta mensagem para todos os homens, porque só há liderança feminina quando os homens são parte da mesma”, concluiu em jeito de apelo.
O gosto pela banca
O gosto de Carolina Remisio pela banca surge ainda na infância, em Luanda, quando teve de ajudar a família a contar avultadas notas de, à época, kwanzas reajustados, pagas à sua mãe pela venda de um carro. “A partir daquele momento pus na minha cabeça que queria trabalhar num banco para poder contar dinheiro. A realidade é que terminei a faculdade, comecei a trabalhar num banco, só que nunca contei dinheiro”, explica sorridente.
Quando deu início ao seu percurso laboral no banco Barclays, em Portugal, tão logo terminou a universidade, foi na parte das grandes empresas e não de particulares, entretanto, área de que veio mais tarde a ser responsável já no Standard Bank, em Angola, mas numa altura em que o país e o mundo foram assolados pela Covid-19, o que limitava o acesso às agências. “Mas está nos meus planos um dia ir a uma agência e atender os clientes”, perspectiva.
De resto, a fase da pandemia é descrita por Carolina como uma das mais difíceis da sua vida profissional, em que tinha de gerir uma equipa com 600 pessoas de forma remota. “Ter de pedir às pessoas para irem abrir as agências, sacrificando-se porque era um serviço primário do banco, quando estávamos todos fechados em casa, foi uma das alturas mais desafiantes da minha carreira”, admite.
Foi uma fase desafiante, mas com bons frutos, pois, garante, conseguiram, pela primeira vez, que a parte do personal business banking não só atingisse o break-even (ponto de equilíbrio), mas fizesse lucro. “Foi de facto gratificante ver que o esforço e o sacrifício que as pessoas fizeram deram resultados positivos”, afirma.