Em Matosinhos, os surfistas são como lapas no oceano. Entre eles estão os engenheiros informáticos, João Lobato Oliveira e Luís Certo, que em Novembro de 2012, num café junto à praia, começaram a dar corpo à ideia de um dispositivo que ajudasse a encontrar pertences pessoais através de uma aplicação móvel.
Escolheram o nome lapa porque o dispositivo se “cola” aos objectos. Os dois empreendedores estavam a fazer o doutoramento em Engenharia Informática quando idealizaram as lapas. “A nível tecnológico já nos mexíamos relativamente bem. Ainda fiz o pós-doutoramento em robótica, no Japão, para onde fui a convite da Honda. Nessa altura, levava as lapas comigo para trabalhar nelas nos tempos livres”, recorda João.
Entretanto, na concretização do projecto acabou também por descobrir uma grande dificuldade na relação com a indústria. “Os nossos fornecedores são todos nacionais, mas a indústria não está preparada para este tipo de tecnologia. Conseguimos desenvolver um protótipo em seis meses, mas entrar em produção e estabilizar demorou um ano e meio”, conta.
João e Luís, 30 e 31 anos, criaram a Lapa Studio em Agosto de 2013. Como tinham apenas 2 mil euros de capitais próprios e era preciso mais dinheiro para avançar com o negócio, lançaram uma campanha de crowdfunding através da plataforma Indiegoo, que em dois meses lhes valeu mais de 57 mil euros.
Começaram logo a vender lapas – pequenos quadrados de plástico com um design inovador, disponíveis nas cores azul-turquesa, branca e preta – e hoje continuam junto ao mar, com vista para a Foz do Douro: a Lapa Studio está no Centro de Incubação Portugal Global, da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE), no Porto.
Inicialmente, vendiam sobretudo on-line. Depois conseguiram um distribuidor canadiano e uma parceria com a Benetton que instalou 2 mil lapas em mochilas escolares. Deram ainda exclusividade a um retalhista para o mercado nacional. Ao todo, venderam 20 mil unidades “Lapa 1”, cuja produção foi, entretanto, descontinuada.
Em 2015 chegou a vez da “Lapa 2”, com uma série inicial de 25 mil unidades, das quais já pré-venderam 15 mil. A “Lapa 2” apita duas vezes mais alto, tem o dobro do alcance em campo aberto (até 60 metros), é à prova de água (até uma profundidade de 3 metros), é resistente ao choque, tem o dobro da autonomia (1 ano), introduz um botão através do qual é possível encontrar o telemóvel, mesmo que este esteja em silêncio, e introduz novos acessórios de silicone para animais de estimação e crianças.
A aplicação, que recorre à tecnologia bluetooth low energy, permite descobrir e dar um toque a qualquer objecto num raio de 60 metros, e grava constantemente a última posição GPS do que se perdeu. Além disso, qualquer utilizador da rede Lapa que passe no raio de alcance do objecto perdido será notificado para o encontrar e terá acesso aos dados do dono para que o devolva.
Tubarões à vista
Para chegar até à “Lapa 2” foi preciso recorrer a uma segunda campanha de crowdfunding (em que conseguiram angariar cerca de 235 mil euros), e foram ao programa Shark Tank, de onde trouxeram dois “tubarões”: João Rafael Koehler e Tim Vieira que compraram 35% do capital da start-up por 350 mil euros.
Conseguiram, depois, contratar seis pessoas e projectar novos voos, nma altura em que entretanto apareceram concorrentes (como o Tile, nos EUA), que obrigaram os jovens empreendedores a lutar pela conquista de preferência da marca no mercado.
“A Lapa 2 distingue-se da concorrência por conciliar uma lista completa de funcionalidades de ‘perdidos e achados’ compatível com todos os dispositivos móveis relevantes de última geração e um dispositivo à prova de água e choque” além do design elegante e miniaturizado “Conseguimos ainda garantir preços competitivos com produção exclusivamente nacional”, sublinha João.
O canal de vendas preferencialé o on-line. “Hoje há lapas made in Portugal em mais de 70 países”, regozija-se João. “O mercado on-line é mais interessante por uma questão de margens do negócio. No mercado físico somos sempre espremidos pelos distribuidores.”
Depois da experiência com a “Lapa 2” (uma unidade custa cerca de 27 euros), “estamos a fazer as coisas com mais calma, queremos começar pelo mercado nacional e seguir para o europeu”, revela o presidente executivo da Lapa Studio.
Abertos a propostas
João não tem qualquer problema em afirmar abertamente que vender a empresa sempre esteve nos planos. “O objectivo de qualquer empreendedor será sempre vender, a qualquer momento. Mas queremos fazer a Lapa crescer de tal forma que se traduza num bom negócio.
Depois é começar outra coisa porque um empreender só está bem a criar”, remata. Até chegar esse dia, “a prioridade é focar no crescimento da empresa tanto em vendas como em parcerias”. O “tubarão” João Rafael Kohler revela à FORBES que apesar de haver “muitas empresas interessadas em comprar a start-up”, ainda tem “paciência para mais um ano” antes de vender a sua participação.
O empresário nota que a Lapa ainda está a crescer, “quer seja através de novas funcionalidades, como as pulseiras para tracking de crianças, quer de parcerias com empresas como a JP Sá Couto (criadora do computador Magalhães). Além disso, está a desenvolver novas áreas de negócio – software para o grupo Sonae, que revolucionará a experiência do consumidor em loja”, revela.
No mercado português, a estratégia passa por atacar directamente os retalhistas. Na Europa a ideia é ter vários e pequenos distribuidores ou então um grande distribuidor. Segue-se a Ásia, tentando evitar os EUA porque é onde a Lapa está mais ameaçada, embora o on-line seja o principal mercado.
A start-up portuguesa tem a sua a marca registada internacionalmente. Já a patente é outra conversa. “A patente acaba por ser uma falácia, serve de pouco, na verdade é um mero instrumento para angariar investimento. Porque qualquer pessoa faz igual fazendo diferente. É muito difícil de defender, a não ser que se tenha uma grande firma de advogados por detrás”, frisa.
Em 2014, a Lapa Studio facturou cerca de 200 mil euros. No exercício de 2015, João diz que as vendas duplicaram. Agora, em 2016, “a nossa ideia é pelo menos 1 milhão de euros, sem especulação”.