A justiça espanhola deixou cair o processo em que um filho do Presidente da Guiné Equatorial e outros membros do Governo do país eram acusados de sequestro e tortura de adversários políticos, cedendo a jurisdição às autoridades de Malabo.
“O juiz da Audiência Nacional cede à Guiné Equatorial a jurisdição para investigar o sequestro e prisão de quatro membros do movimento de oposição” MLGE3R (Movimento para a Libertação da Guiné Equatorial – Terceira República) em novembro de 2019, lê-se num comunicado divulgado hoje pela justiça de Espanha.
Segundo o mesmo comunicado, citado pela Lusa, o juiz da Audiência Nacional Santiago Pedraz, que tutelava o caso, tomou esta decisão em resposta a uma carta rogatória da justiça da Guiné Equatorial, que pediu a transferência de jurisdição do processo “por se ter aberto um procedimento por causa dos mesmos factos e contra as mesmas pessoas” no país africano.
O caso aberto na Audiência Nacional de Espanha, uma instância que investiga e julga a criminalidade mais grave, remonta a Outubro de 2022 e teve como origem uma queixa apresentada pelo MLGE3R por alegado sequestro e tortura de quatro opositores ao regime da Guiné Equatorial.
A denúncia visava, como alegados autores dos crimes, Carmelo Ovono Obiang, actual secretário de Estado da Presidência e filho do Presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang; Nicolás Obama Nchama, ministro de Estado da Segurança Nacional, e Isaac Nguema Ondo, diretor-geral da Segurança Presidencial.
Os quatro sequestrados, segundo a queixa, eram membros do MLGE3R: Martín Obiang e Bienvenido Ndong, residentes em Espanha, e Feliciano Efa e Julio Obama Mefuman, de nacionalidade espanhola.
Os factos teriam ocorrido numa viagem de Madrid a Juba, capital do Sudão do Sul, onde teriam sido capturados em 15 de Novembro de 2019.
Segundo a denúncia, citada pela agência noticiosa Europa Press, os quatro foram “transferidos clandestinamente num avião oficial do regime da Guiné Equatorial e encarcerados num centro de detenção”.
Os dois cidadãos espanhóis, Efa Mangue e Obama Mefuman, que morreram entretanto na prisão, foram acusados de participação num golpe contra o regime do Presidente Teodoro Obiang, pelo qual foram condenados num processo militar a 90 anos e 70 anos de prisão, respetivamente.
O juiz espanhol Santiago Pedraz justificou, segundo o comunicado hoje divulgado, que “não há base alguma para concluir” que “haja factos cometidos em Espanha” ou que “a actividade criminosa se tenha desenvolvido pelo menos parcialmente” neste país.
Santiado Pedraz invocou que, por outro lado, “não pode pôr em dúvida” que “o procedimento” aberto na Guiné Equatorial “seja desprovido de parcialidade ou seja meramente instrumental”.
Por fim, o juiz considerou que “não há porque duvidar” de que foi de facto aberto um processo em Fevereiro de 2023 pela justiça equato-guineense ou que “não se siga um processo com as devidas garantias reconhecidas pelo Direito Internacional”, atendendo aos termos do pedido feito a Espanha para cedência da jurisdição neste caso, assim como à legislação do país africano.
Ainda assim, Santiago Peraz lembrou que “existe uma cláusula de salvaguarda para que o juiz possa perseguir os delitos em Espanha quando o Estado que exerce a sua jurisdição não está disposto a levar a cabo a investigação ou não pode efetivamente fazê-lo”.
Teodoro Obiang, de 81 anos, governa o país desde 1979, quando derrubou o seu tio Francisco Macias, num golpe de Estado, e é o Presidente há mais tempo em funções no mundo, não considerando regimes monárquicos.