Um empresário assumido com um olhar diferente sobre a arte, assim nos deixa, aos 48 anos, Sindika Dokolo, um dos maiores coleccionadores de arte africana do mundo, um acérrimo crítico das políticas do seu país, o Congo, e, também, o marido de Isabel dos Santos.
Nascido em Kinshasa, filho do self-made man e banqueiro Augustin Dokolo Sanu e da sua segunda mulher, a dinamarquesa Hanne Taabbel, frequentou o liceu Saint Louis de Gonzague, em Paris, e prosseguiu os estudos na Universidade Paris Vi Pierre et Marie Curie, onde se licenciou em Economia, Comércio e Línguas Estrangeiras. Com a mãe percorria as galerias e com o pai crescia a paixão pela arte.
Uma Fundação para a Arte
Sindika tinha mundo, para lá do seu continente, e isso proporcionou-lhe um aguçado sentido crítico na política, na economia e…nas artes, talvez a herança mais forte do seu pai. Começou a sua colecção aos 15 anos e dali até à criação da Fundação Sindika Dokolo foi um percurso de determinação que culminou com a repatriamento para Angola de 20 peças de arte que tinham sido levadas de museus angolanos para colecções estrangeiras. Porquê Angola? Bom, porque Angola tinha entrado na sua vida por um mero acaso, mas entrou para ficar. Foi em 1999, após ter perdido um avião para o Brasil e ser obrigado a ficar uma semana em Luanda que conheceu o país: “era um momento difícil da história de Angola, ainda havia a guerra, existiam muitas incertezas, mas fiquei logo muito sensível à atitude voluntarista, à consciência de si e à dignidade do povo angolano”, diria em entrevista ao português Jornal de Negócios, em 2012, altura em que foi condecorado em Portugal com a Medalha de Mérito/Grau Ouro, atribuída pela Câmara do Porto, por ter cedido 80 obras da sua coleção de arte para a exposição “You Love Me, You Love Me Not”.
Quatro anos mais tarde, em fevereiro de 2016, ainda com José Eduardo dos Santos no poder, a Fundação Sindika Dokolo entregou ao então Presidente de Angola, em Luanda, duas máscaras e uma estatueta do povo Tchokwe, que tinham sido saqueadas durante o conflito armado, recuperadas após vários anos de negociação com colecionadores europeus. Isto porque estava determinado em “dar a conhecer ao mundo os artistas africanos”, essa era a essência da Fundação: emprestar gratuitamente as obras da colecção a qualquer museu internacional desde que, em contrapartida, esse museu apresente a mesma exposição num país africano à sua escolha.
Angola e Congo juntos
Mas apesar da sua intensa relação com Angola, Sindika não descurou o seu país natal. Crítico dos quase 20 anos do regime do presidente Joseph Kabila na República Democrática do Congo, que lhe custou cinco anos no exílio, devido aos processos movidos contra si em Kinshasa, acaba por regressar apenas em maio de 2019, já depois da chegada ao poder de Félix Tshisekedi, que tomou posse como chefe de Estado congolês em Janeiro. Tinha uma visão, partilhada com a Jeune Afrique, que passaria por ver “Angola e República Democrática do Congo como um conjunto complementar” – um eixo Luanda -Kinshasa que poderia criar um contrapeso para a supremacia sul-africana”.
O filho da terra é, agora, reconhecido pelo seu “vigor, espírito de luta e compromisso que tinha com um Congo justo”, palavras sentidas e partilhadas via Twitter por Lubaya Claudel André, deputado republicano e vice-presidente do Comité de Acompanhamento de Políticas Públicas daquele país.
E é também nas redes sociais que se acumulam mensagens de pesar à família Dokolo que já reagiu à morte do empresário, agradecendo a todos os que expressaram sentimentos de pesar, solidariedade e bondade e que partilham” a sua “dor”. E de Isabel dos Santos para Sindika, fica o post mais comovente: “my love”, uma história de 18 anos em comum, quatro filhos e uma empatia para lá da vida familiar.