O Primeiro-ministro de Cabo Verde, José Ulisses Correia e Silva, disse esta semana serem objectivos do Executivo que lidera atingir 30% de produção de energia eléctrica a partir de fontes renováveis, até 2025, ultrapassar os 50% em 2030 e alcançar 100% em 2040, desafio que deve ser acompanhado por medidas de redução progressiva da intensidade energética, no sentido de se melhorar a eficiência.
O governante que discursava na IX Conferência sobre as Mudanças Climáticas em África, que decorre na cidade cabo-verdiana de Santa Maria desde a última Quarta-feira e que hoje termina, afirmou ser ainda meta do governo cabo-verdiano atingir 100% da mobilidade eléctrica em 2040, começando por substituir, até 2026, 25% da frota nacional de transportes públicos rodoviários por veículos eléctricos.
“As mudanças climáticas são uma ameaça real para Cabo Verde, um dos países mais vulneráveis aos impactos deste fenómeno, exposto a eventos extremos, como secas severas, chuvas intensas e irregulares, cheias, avanço do mar e erosão costeira. Orientamo-nos pela responsabilidade ambiental, alinhada com os grandes princípios e acordos internacionais em matéria do ambiente e condizentes com as condições de um Estado insular de ecossistemas frágeis”, frisou.
De acordo com José Ulisses e Silva, é com a valorização dos recursos endógenos associados ao capital humano e à tecnologia, que o seu governo ambiciona aumentar a resiliência económica e ambiental do país, transformando, em primeira instância, o sol e o vento em energia segura, eficiente e sustentável em mercados regulados, e, em segundo lugar, viabilizando a agricultura, através da diversificação das fontes de irrigação.
“Cabo Verde é um país que chove pouco e de forma irregular. Queremos reduzir a dependência da agricultura das chuvas, através da massificação da dessalinização de água salobra, da reutilização segura das águas residuais tratadas, do recurso à energia fotovoltaica e da massificação da rega gota-a-gota”, precisou, garantido ser neste sentido que os investimentos e as reformas têm sido feitos nos últimos anos.
O aproveitamento dos recursos do mar será também, como refere Ulisses, outro meio a explorar para que se alcance a resiliência económica e ambiental, até porque, diz, Cabo Verde é um país com muito mais mar do que terra. Por isso, o governante elege também o desenvolvimento da economia azul como uma prioridade do ponto de vista económico, da preservação da biodiversidade, do conhecimento e da investigação científica e oceanográfica.
Um outro pilar da rota do desenvolvimento económico, tirando partido do ambiente, apontado pelo Primeiro-ministro cabo-verdiano é a criação de competências humanas, institucionais e relacionais para melhorar a governança climática, referindo que “estamos empenhados na melhoria da governança climática, com a criação de uma autoridade pública para garantir o planeamento, gestão e implementação da política climática do país e para dotar o país de Planos de Resiliência Climática nos sectores-chave de desenvolvimento, como recursos hídricos, agricultura, saúde, zonas costeiras e turismo”.
“África é o continente que produz menos emissões de gases com efeito de estufa – 4% do total – mas que sofre mais as consequências das alterações climáticas. Esta percentagem não é para ser aumentada com a transferência de responsabilidades climáticas dos países desenvolvidos”, alertou o Primeiro-ministro de Cabo Verde.
“Alívio da dívida externa dos SIDS deve ser prioridade”
Por outro lado, José Ulisses e Silva apelou para que se encare “com sentido de prioridade” o alívio da dívida externa dos países em desenvolvimento e dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento, na sigla SIDS – do inglês Small Island Developing States, que segundo afirma, “muitos deles ficaram mais endividados devido à grave contratação económica e às despesas extraordinárias para a protecção sanitária e social, derivadas da pandemia da Covid-19”.
Estes países [SIDS], argumenta o governante cabo-verdiano, “estão confrontados com triplo desafio”, designadamente, responder à crise pandêmica e relançar as economias; alinhar respostas preventivas e de acção climática e investir em transformações estruturais que aumentem a resiliência, o potencial de crescimento económico, bem como as possibilidades de atingir o desenvolvimento sustentável.
“Estamos assim a falar de tripla dimensão inter-relacionada do financiamento: financiamento para vencer a pandemia, nomeadamente o acesso universal à vacina; financiamento para a acção climática, de iniciativas de adaptação e mitigação; e financiamento para a agenda 2030 do desenvolvimento sustentável”, enumerou.
Os SIDS – um grupo distinto de 38 Estados-membros da ONU e 20 não-membros (associados das comissões regionais das Nações Unidas) que enfrentam vulnerabilidades sociais, económicas e ambientais únicas – são economias pequenas e com elevado grau de abertura ao exterior, muitas delas fortemente dependentes do turismo, categoria de países em que se insere Cabo Verde.
“É importante ter em conta a especificidade dos SIDS no que se refere à sua elevada exposição a choques externos e aos critérios de elegibilidade com base no PIB per capita, que os penaliza”, advogou o chefe do governo cabo-verdiano.
Na sua intervenção Ulisses abordou ainda o papel “indispensável” que África deve desempenhar nos esforços globais para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e limitar o aquecimento global a 1,5 graus celsius, da massificação das energias renováveis, que vê como uma “grande” oportunidade industrial e de criação de empregos para o continente, bem como a necessidade de se assegurar que a agenda de financiamento climático não fique prejudicada.