Pedro Gadanho voltou a Portugal depois de quatro anos como curador do Museum of Modern Art (MoMa), em Nova Iorque, e desde o Verão passado está à frente dos destinos do Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia (MAAT).
O projecto da Fundação EDP abrirá portas ao público já no próximo mês de Outubro.
“O MoMa permitiu uma experiência de aprendizagem muito rápida. Todas as diferentes experiências que lá vivi deram-me uma espécie de âmbito muito alargado”, conta-nos, sem nunca perder o sorriso simpático com que nos recebeu. Mas “abrir um museu é um privilégio e uma oportunidade” que nem todos têm, justifica, quando lhe perguntamos como trocou a louca Nova Iorque pela pacata Lisboa.
Para os próximos três a quatro anos estão já programadas cerca de 50 exposições, que vão contemplar artistas portugueses e estrangeiros, de mais ou menos renome, que mereçam atenção no que à arte moderna diz respeito. Com um orçamento anual para produção a rondar os 2 milhões de euros, o MAAT vai ainda ser um chamariz pela arquitectura impressionante do edifício que, por agora, ainda é pouco mais que um esqueleto ao lado do Museu da Electricidade. “É uma mistura explosiva”, diz o arquitecto, que acredita que as linhas contidas do MAAT casam lindamente com o rio Tejo que lhe passa atrás, e que a dicotomia entre as arquitecturas do século XX e XXI serão um dos principais pontos de atracção. Junta-se a diferença do desenho às duas pontes que ligarão os edifícios a Belém e, acredita Pedro, há potencial para se criar um espaço que fará “parte do dia-a-dia das pessoas.
É isso que queremos fazer”.
O difícil reconhecimento em Lisboa
Pedro admite que passou a ser conhecido apenas depois de ter chegado ao MoMa, e que em Portugal continua a acontecer algo que considera repelente: “queimamos gerações muito bem formadas por causa do conservadorismo” que continua a fazer com que “o nepotismo e a cunha sejam muito mais importantes” do que o mérito. É justamente essa cultura que pretende contrariar com o trabalho no MAAT: afinal, o principal objectivo vai ser precisamente dar exposição a artistas, portugueses e estrangeiros, que mereçam destaque no panorama
da arte contemporânea.
A programação vai ser intensiva e promete prover a capital de um género de cultura que hoje só é possível encontrar em cidades como Londres, Paris ou Nova Iorque. “Importa trazer até aos portugueses, até Lisboa, exposições, trabalhos de elevada qualidade”, diz. O MAAT quer “mostrar o trabalho de artistas portugueses; exposições que andem a circular pela Europa” e vai ter também “exposições temáticas, conferências, workshops e serviços educativos. Temos uma sala oval de 800 metros quadrados onde nos pareceu que só seria possível fazer grandes instalações com grandes nomes internacionais”, como a francesa Dominique Gonzalez-Foerster, que já está confirmada, ou o cubano Carlos Garaicoa, revela o director do museu.
Além dos nomes mais sonantes, o MAAT terá também as chamadas exposições manifesto, onde os artistas são convidados a reflectir a contemporaneidade. Aliás, é precisamente uma exposição deste género que dará o pontapé de saída na programação do museu, já durante este mês de Junho – é que se é verdade que as portas do novo edifício só abrem a 5 de Outubro, o Verão é um bom mote para começar a mostrar um pouco daquilo que se poderá encontrar no MAAT: são quatro as mostras que estarão disponíveis nas salas da Central Tejo – também elas renovadas recentemente – e que prometem aguçar o apetite dos apreciadores de arte contemporânea. A ‘Lightopia’, por exemplo, já esteve patente em Weil am Rhein, na Alemanha, no Espace Fondation EDF, em Paris, e no Design Museum Gent, na Bélgica. Chega a Lisboa no dia 28 de Junho e ficará até 11 de Setembro, onde o público poderá ver uma panóplia de trabalhos realizados nos domínios do design e da arquitectura, entre outras. Ao mesmo tempo, peças da colecção Fundação EDP vão também estar em exposição. “Em vez de termos uma exposição permanente, decidimos fazer várias mostras com partes da colecção da Fundação”, explica-nos Pedro, antes de adiantar que o MAAT também se concentrará em analisar obras que possam enriquecer o espólio da Fundação.
Os novos lisboetas
A programação do MAAT tem como grande objectivo aproximar a arte contemporânea dos portugueses no geral, e dos lisboetas em particular. Neste sentido, Pedro chama a atenção para o novo fenómeno de que a capital portuguesa está a ser alvo – e cujo público pretende captar. É que há dezenas, talvez centenas, de cidadãos europeus a trocar os seus países de origem pelas sete colinas lisboetas. “Lisboa tem uma qualidade de vida extraordinária”, nota o arquitecto. “Além de termos o oceano e boa comida, a cidade oferece uma boa mobilidade para quem trabalhe num contexto internacional”, sublinha, lembrando que em pouco mais de duas horas é possível estar em várias capitais europeias. “Isso está a determinar a movimentação de pessoas que percebem que em Lisboa conseguem ter o melhor dos dois mundos”, continua: a calma de uma cidade segura, com uma luz inigualável e um carisma muito próprio, e a proximidade europeia tão necessária sobretudo às novas gerações. São precisamente estas pessoas, habituadas a poder passear-se por alguns dos melhores museus do mundo, que Pedro quer trazer até à beira do Tejo, para admirar e pensar a arte contemporânea. Mas desengane-se se acha que no MAAT só vai ver iniciativas do próprio museu.
O diálogo com os espaços culturais adjacentes ao Museu da Electricidade, como é o caso do Centro Cultural de Belém e a Fundação Champalimaud, por exemplo, é um dos objectivos do director do MAAT. Em cima da mesa, revela-nos, já existem conversações para uma conferência que poderá acontecer em Novembro, em parceria com a Fundação Champalimaud, que juntará no mesmo dia reflexões sobre neurociências e urbanismo. Mas, por agora, Pedro continua a trabalhar afincadamente para preparar todas as exposições que – com curadoria interna ou externa – terá que montar no ‘seu’ novo museu. “Em qualquer outro lugar do mundo teria umas 75 pessoas a trabalhar comigo. Aqui somos 25. Isso mostra que os portugueses são muito bons no que fazem”, atira-nos com uma gargalhada e o sorriso sério de quem sabe quanto vale o trabalho de quem o acompanha.
Montar um museu de raiz não é para todos, mais ainda quando nos parece quase impossível que este monte de betão e ferro para o qual olhamos possa transformar-se num edifício cheio de arte que as maquetas nos prometem já no próximo mês de Outubro. Mas lá estaremos para o confirmar.