Há quase 2 mil fundos cotados em Wall Street e todos querem dar nas vistas. Mas será que há espaço para mais?
William Rhind, o temerário fundador da GraniteShares, uma empresa especializada na criação destes fundos que replicam índices de acções
(e que são mais conhecidos por Exchange Traded-Funds – ETF) não tem dúvidas: ainda há muito espaço para crescer.
Rhind comanda as operações a partir de uma pequena sala num espaço de coworking em Manhattan, e tem em carteira um fundo de ouro de desconto, dois fundos de commodities e uma combinação invulgar de obrigações de alto rendimento.
A Securities and Exchange Commission (SEC), o órgão regulador do mercado de valores mobiliários dos EUA, rejeitou diversos pedidos de criação de um ETF de criptomoedas apresentados pela GraniteShares, mas tudo indica que irá reavaliar esses pedidos em breve.
Os oito funcionários da empresa têm vindo a desbravar uma indústria que ainda é dominada por pesos-pesados como a BlackRock, a Vanguard e a State Street, cujos activos são mil vezes maiores que os da GraniteShares. Isto só mostra que este mercado não é para qualquer um. É preciso ter garra e espírito empreendedor.
Rhind, de 39 anos, nasceu na Escócia, país onde se respira capitalismo. Estamos a falar da terra natal de Adam Smith, dos fundos de investimento nascidos no século XIX, percussores dos fundos que hoje conhecemos.
Na adolescência, Rhind inspirou-se no exemplo de Ian Wood, pai do seu melhor amigo, que, ainda muito jovem, decidiu tomar conta do negócio da família e hoje é um magnata da indústria petrolífera.
Em 2007, Rhind tinha um emprego seguro no escritório londrino da iShares, então um braço do gigante Barclays e actualmente parte integrante da BlackRock.
A ambição falou mais alto e decidiu ir para a ETF Securities, uma operação de pouco mais de 250 milhões de euros que não parava de perder dinheiro. Rhind optou por ter um salário mais baixo em troca de acções da empresa.
Foi um grande risco? Nem por isso, explica Rhind, porque o negócio de ETF estava a crescer rapidamente e porque os fundos estavam ávidos de talento. Além disso, se a coisa corresse mal, podia sempre arranjar trabalho numa das grandes casas de investimento de Wall Street.
Mudar de emprego sabia a pouco, por isso subiu a parada e aplicou parte das suas poupanças em mais acções da ETF Securities. Os activos da empresa centuplicaram, mas o seu fundador, Graham Tuckwell, não se decidia a vender ou a cotar a empresa em Bolsa.
E, por isso, Rhind voltou a mudar de ares.
Voos mais altos
Ao fim de alguns anos à frente do SPDR Gold Shares ETF, com activos avaliados em cerca de 25 mil milhões de euros, Rhind começou a sentir saudades de brincar aos empreendedores. Em 2016 ingressou na GraniteShares e lançou o seu primeiro ETF um ano depois.
Teve a ajuda da Bain Capital Ventures e de outros investidores, mas conseguiu manter mais de metade dos activos em seu poder.
Os dois primeiros produtos – Bloomberg Commodity Broad Strategy No K-1 e S&P GSCI Commodity Broad Strategy No K-1 – reuniam um leque de matérias-primas diversificadas e praticavam comissões inferiores às da concorrência: os rácios de despesa correspondem, por exemplo, a menos de metade da comissão cobrada pelo Invesco DB Commodity Index Tracking Fund, que gere activos no valor de 2 mil milhões de euros.
Seguiu-se um fundo de barras de ouro que tinha por objectivo roubar clientes ao antigo empregador de Rhind. O SPDR Gold cobra uma comissão de 0,4% ao ano aos investidores, ou cerca de 420 euros a quem queira investir em cem onças de ouro, ao passo que o GraniteShares Gold Trust cobra metade desse valor.
O arranque foi lento, mas a empresa ganhou élan na Primavera do ano passado e já soma mais de 300 milhões de euros em activos sob gestão. E lucro?
Até agora, nada. Rhind está a fazer uma gestão semelhante àquela que Jeff Bezos aplicou nos primeiros cinco anos de vida da Amazon: primeiro o volume, depois o lucro. Se tiver mil milhões de euros no final deste ano, talvez a empresa possa valer, aos olhos de um comprador, 100 mil milhões de euros.
Não vai ser fácil, mas, mais tarde ou mais cedo, o crescimento da indústria de ETF terá de abrandar, até porque os grandes players já estão em guerra para reduzir as comissões.
Actualmente é possível ter um ETF de acções por um custo de apenas 0,03% ao ano – um valor impraticável se os activos em gestão rondarem os mil milhões de euros. Rhind é taxativo: “Há 25 anos que isso acontece. É um fenómeno que afecta apenas os benchmarks mais comoditizados e com mais tráfego. Aliás, o mercado é segmentado: há imensos produtos diferentes e os comportamentos dos compradores são também muito diversos”.
O SPDR Gold, uma joint venture entre a State Street e a indústria mineira, não vai deixar que um recém-chegado comece a roubar-lhe os clientes mais sensíveis aos preços.
O seu emissor não mexeu na comissão, mas decidiu lançar um novo fundo em Junho do ano passado, o SPDR Gold Mini Shares Trust, que cobra uma comissão de 0,18% – uma unha abaixo da comissão de Rhind, de 0,2%. Rhind diz que há espaço para os dois fundos, na medida em que atraem um tipo de cliente diferente.
O seu fundo, à imagem do antigo SPDR, tem acções indexadas ao valor de um décimo de uma troy ounce (31,103 gramas). O SPDR Mini, tal como o iShares Gold Trust (comissão de 0,25%), replica um centésimo de uma onça e interessa essencialmente a quem quer comprar pequenas unidades de participação.
Se o objectivo for a especulação overnight, a elevada liquidez do SPDR Gold torna-o mais interessante em termos de custos, mas se quiser investir por um período de um ano, o produto de Rhind é mais vantajoso (ver quadro).
Se a inflação continuar a agravar-se, é provável que o desempenho dos ETF de ouro e de commodities de Rhind venha a ser bastante positivo. Se isso não acontecer, é bom que tenha outros truques na manga, como um ETF de bitcoins.
Nesse caso, a concorrência viria de pequenas empresas e não da Vanguard. Nenhum gestor responsável por mil milhões de euros de activos vai arriscar a sua reputação, e menos ainda por algo tão volátil como as criptomoedas. “É o ciclo da vida: uma empresa cresce e as suas prioridades mudam”, explica Rhind.
O ETF Hips U.S. de Alto Rendimento da GraniteShares tem apenas 7 milhões de euros sob gestão, mas tudo indica que vai conquistar o segmento dos reformados por combinar uma série de parcerias de alto rendimento com fundos de investimento imobiliário e empresas de business development.
Este mix não só se traduz numa taxa de rendibilidade de 6% como lhe permite evitar os custos inerentes à tributação de mais-valias, que penalizam muitos ETF. Ora, o Vanguard não tem qualquer produto do género. Mas há mais. A aposta de Rhind em acções da ETF Securities deverá começar a dar frutos no final deste ano.
Após anos de hesitações, Tuckwell decidiu vender a empresa em parcelas por um valor próximo de 570 milhões de euros. Rhind não revela o que tenciona fazer com esta injecção de dinheiro, mas não é provável que o deixe quieto no banco. Se a GraniteShares tiver mais capital, poderá chegar mais rapidamente aos mil milhões, ou mesmo aos 10 mil milhões de euros em activos.
Há um poema de Rudyard Kipling que diz: “Se és capaz de arriscar tudo o que conseguiste/ Numa única jogada de cara ou coroa,/ E, perdendo, recomeçar tudo do princípio,/ Sem lamentar o que perdeste”.