O novo ciclo estratégico da Sogrape iniciou-se no dia 1 de janeiro de 2015 com a chegada de Fernando da Cunha Guedes à presidência executiva. O financeiro com o bichinho da terra é o mais novo dos irmãos Guedes, com 47 anos. Talvez porque ganhou cedo a visão de mundo, só pensa em continuar a crescer. “Queremos continuar a trabalhar bem em Portugal e temos de aumentar a posição em Espanha, por via de novas aquisições. É nisso que vamos estar focados nos próximos anos”, revela.
Assim se explica, em parte, como esta empresa familiar soube chegar ao século XXI líder do sector dos vinhos em Portugal. Fez crescer os seus vinhos e comprou empresas-chave como a Casa Ferreira, a Offley e a Sandeman, entre outras, até deixar de ser rebocada pelo vinho português mais vendido no mundo: o Mateus Rosé.
A outra parte do sucesso resulta de um casamento feliz entre os valores da família e uma gestão profissionalizada. “Isto torna-nos diferentes e muito fortes”, adianta Fernando da Cunha Guedes, o 4.º presidente executivo da Sogrape, que sucede a Salvador, o irmão mais velho que se afastou por razões de saúde. O outro irmão, Manuel, tem a seu cargo a Grape Ideas, no enoturismo. E o pai, Fernando Guedes, chairman da Sogrape – que, apesar de estar quase a completar 85 anos, fez no passado mês de Setembro 80 mil quilómetros em nome das vindimas.
“Para o ano quer ir à Argentina e ao Chile para ver como estão os negócios, há muito tempo que lá não vai”, conta o presidente executivo da Sogrape.
Fernando não fará igual ao avô, nem ao pai ou tão pouco ao irmão. Mas também não se esperem diferenças irreconciliáveis, porque o novo programa estratégico foi definido pela família, apoiada pela consultora Boston Consulting Group. Ou seja, depois da fundação da empresa, em 1942, com o avô Fernando Van Zeller Guedes a criar o Mateus Rosé, e de uma forte temporada de aquisições iniciada pelo pai, Fernando Guedes, e continuada pelo irmão Salvador, o terceiro Fernando fará a passagem da diversificação à concentração.
“Em Portugal estamos presentes nas regiões em que temos que estar (Douro, Alentejo, Bairrada, Dão e Vinhos Verdes), falta-nos desenvolver mais a nossa presença em todas elas. Temos a ambição de crescer e de forma acelerada no Alentejo. Não nos podemos esquecer da enorme oportunidade que continua a existir na internacionalização desses mesmos vinhos. Temos o mercado interno, mas temos um mundo à nossa espera”, revela o empresário à FORBES. Isso significa fazer da Sogrape “a referência ibérica nos vinhos de qualidade”. E não se avizinha um caminho espinhoso, pelo contrário.
A ajudar estará o facto de a empresa ter sido eleita, este ano, como a melhor produtora de vinhos no mundo pela Associação Mundial de Críticos e Jornalistas de Vinhos e Bebidas Espirituosas. Além disso, a Sogrape entrou em Espanha pela porta grande quando comprou a Bodegas LAN, da Rioja, em 2012. Hoje, esta origem prioritária exige à família Guedes novas aquisições naquela que considera ser a região espanhola de vinhos de qualidade. As outras regiões onde está presente – Rías Baixas, Rueda e Ribera del Duero -, serão nesta fase um complemento.
lândia) são importantes no seu todo.No total são 1440 hectares de vinha plantada – 53% estão localizados em Portugal. “Ajudam-nos a ser fortes no mercado internacional com um portefólio global, mas o enfoque estará no desenvolvimento da região ibérica”, sublinha. Dito de outra forma: “Temos que ser diferentes e ir ao encontro do que o nosso consumidor quer.”
O primeiro ano à frente dos comandos da empresa “está a correr bem” ao novo líder da Sogrape que prevê aumentar este ano o volume de negócios entre 3% e 5%.“De qualquer maneira, neste sector, os últimos quatro meses são decisivos”, esclarece.
Mateus Rosé, Sandeman, Casa Ferreirinha, Gazela e LAN são “marcas prioritárias” num portefólio com mais de 30 marcas porque “têm as vantagens competitivas e o potencial para se reforçarem globalmente”, salienta Fernando. Esse rico espólio fez com que no ano passado a Sogrape registasse vendas de 132 milhões de euros, menos 6% do que em 2013 e ao nível do contabilizado em 2011. Deste bolo, cerca de 60% teve como origem somente cinco mercados: Portugal, EUA, Espanha, Reino Unido e Angola.
A Finca Flichman, no mercado argentino, foi a primeira base produtiva da Sogrape no estrangeiro, tendo sido adquirida em 1997. Mesmo com as dores de cabeça dos últimos anos, a operação é para manter. “Vender está fora de questão, nem a Finca Flichman nem qualquer outra unidade de negócio”, responde o presidente executivo da Sogrape.E explica: “A Argentina passa por dificuldades fruto de uma condição macroeconómica adversa, que se arrasta há muitos anos.
O país tem uma moeda que está altamente sobrevalorizada, que o governo teima em não deixar flutuar. Ao mesmo tempo tem uma inflação altíssima, na casa dos 40%. Obviamente que isto inviabiliza qualquer projecto exportador naquele país. Uma situação destas vai-se suportando ao longo de determinado tempo, mas depois não dá mais para suportar.” Fernando acredita que a situação irá em breve mudar, seja quem for o novo inquilino da Casa Rosada. “Contamos já, no segundo semestre de 2016, que sejam tomadas algumas medidas no sentido de normalizar a situação”, atira. Em 2014, quando analisadas em euros, as vendas na Argentina tiveram uma quebra de 30%.
Independentemente das eleições presidenciais na Argentina, na Finca Flichman, e também na Viña Los Boldos, no Chile, estão a ser desenvolvidos planos estratégicos internos e a ocorrer algumas alterações ao nível de gestão.Em 2014, a Finca Flichman pesou 7% nas vendas totais da Sogrape, enquanto a chilena Viña Los Boldos e a Framingham, na Nova Zelândia, ficaram pelos 2% cada. A empresa registou também uma desaceleração nas “novas plataformas de crescimento”, como são os casos da China e da Rússia.Segundo Fernando, “a estratégia não é um dogma na Sogrape”, por isso, as orientações vão sendo ajustadas em função da evolução do cenário global.
IR MAIS ALÉM
Mais do que afinidade cultural, Angola e Brasil são dois mercados com potencial para a Sogrape. Em 2014, o mercado angolano pesou 7% nas vendas e o mercado brasileiro 1%. Em ambos, a empresa portuguesa ambiciona uma posição mais forte. “No caso de Angola a empresa chama-se Vinus, tem mais de dez anos e está com um desempenho muito bom. Já a Sogrape Brasil é uma empresa mais recente, está a dar os primeiros passos em termos de afirmação.
“São claramente dois países de aposta futura e ambos, neste particular momento, a sofrer algum revés do ponto de vista macroeconómico. Mas uma das nossas caraterísticas e pontos fortes é a visão de muito longo prazo e não estamos preocupados. Iremos com certeza certeza continuar a investir em ambos”, adianta o gestor.
Mesmo com a crise de divisas, as vendas da Sogrape em Angola registaram um impulso notável em 2014 e atingiram os 12 milhões de euros. Com este resultado, o mercado angolano representou um dos maiores crescimentos para a empresa (cerca de 15%).
Até à data, a Sogrape tem no mercado angolano uma reprodução fiel do que se passa no mercado português. Destacam-se as marcas Casa Ferreirinha e Gazela, seguidas por Mateus Rosé, Herdade do Peso, Quinta dos Carvalhais e Porto Ferreira. Mas o consumidor angolano também aprecia Grão Vasco, Planalto e Esteva. E o segmento premium está igualmente a crescer, pois Luanda está cada vez mais internacional e tem a restauração em franco desenvolvimento. Apesar de 2015 estar a ser um ano positivo, a questão que se coloca é a evolução da moeda, ou melhor, a desvalorização do kwanza.
Para a Sogrape, o core do negócio está e sempre estará no vinho. Todavia, isso não significa que não procure explorar novos mercados, como seja o lado turístico da sua história através da promoção de visitas às caves de vinho do Porto, em Vila Nova de Gaia. As caves Ferreira (onde é a sede do grupo), Sandeman e Offley recebem por ano 250 mil visitas. O potencial é enorme. Fernando salienta que através de uma empresa autónoma, a Grape Ideias, têm já uma série de projectos de enoturismo em carteira.
“Neste momento ainda estão no segredo dos deuses, mas são projectos no Douro, no Porto e noutras zonas do país, associadas a marcas do nosso portefólio. São projectos que passarão sempre pela área da restauração, hotelaria e lazer. O que posso dizer é que são três ou quatro projectos, todos distintos, com ambições e dimensões diferentes”.
O vinho é e continuará a ser o negócio principal da Sogrape, mas isso não significa que não possa explorar novos projectos.
FORÇA DA EXPORTAÇÃO
A crise que se fez sentir em Portugal nos últimos anos passou praticamente ao lado das contas da Sogrape, que no ano passado fechou as contas com lucros acima dos 10 milhões de euros, mais 53% do que em 2010. A chave do sucesso está na pujança do mercado internacional, que hoje já é responsável por cerca de 70% das vendas da empresa.